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Beaf - Biblioteca Escolar António Ferraz

"Ler engrandece a alma!" [Voltaire]

Beaf - Biblioteca Escolar António Ferraz

"Ler engrandece a alma!" [Voltaire]

Chá de Livros em 2010-02-24

Lia, com gosto, aquele livro encontrado ao acaso. Braços poisados na mesa, pulsos de mãos abertas em atril, apontando o tecto, os dedos afagavam a capa sedosa.
As folhas, alvas e cheias dos silêncios que são os espaços entre as letras, ofereciam-se, generosas em sons, sabores e cheiros.
O livro abrira-se ali, precisamente nas páginas que alguém fizera abrir além da norma, forçando-as.
No texto, um menino recorda o sabor do chá que um pequeno bolo (uma madalena) absorveu. Esse momento marcara-o para sempre: toda a infância contida nessa sensação de bolo húmido enrolado pela língua e saboreado contra o palato. O menino fecha os olhos. O mundo pára. Naquele século XIX havia, por certo, mais tempo para viver sensações…
Hoje, dia de Fevereiro em que o I entre os XX viajou para depois deles, eu corto em dois o meu dia, esqueço-me entre os vivos e detenho-me a ler a descrição prolongada e perfeita na qual, desde o Outro Lado – o da morte – um pequeno rapaz faz apelo a todas as sensações que em nós dormem: esqueço-me de quem sou, do tempo que por mim passa, das ridículas obrigações dos dias esvaziados de sentido e de infância e leio detidamente, como quem reza, esse bocado de mim que alguém escreveu mesmo antes do projecto da minha existência.
Ao meu lado, uma voz traz-me ao mundo, pergunta:
«- E o que vai tomar para acompanhar esse livro?...»
«- Um mil folhas e… um chá. Um chá de livros.»
Autor: V. P.

Chá de Livros em 2010-02-24

Lia, com gosto, aquele livro encontrado ao acaso. Braços poisados na mesa, pulsos de mãos abertas em atril, apontando o tecto, os dedos afagavam a capa sedosa.
As folhas, alvas e cheias dos silêncios que são os espaços entre as letras, ofereciam-se, generosas em sons, sabores e cheiros.
O livro abrira-se ali, precisamente nas páginas que alguém fizera abrir além da norma, forçando-as.
No texto, um menino recorda o sabor do chá que um pequeno bolo (uma madalena) absorveu. Esse momento marcara-o para sempre: toda a infância contida nessa sensação de bolo húmido enrolado pela língua e saboreado contra o palato. O menino fecha os olhos. O mundo pára. Naquele século XIX havia, por certo, mais tempo para viver sensações…
Hoje, dia de Fevereiro em que o I entre os XX viajou para depois deles, eu corto em dois o meu dia, esqueço-me entre os vivos e detenho-me a ler a descrição prolongada e perfeita na qual, desde o Outro Lado – o da morte – um pequeno rapaz faz apelo a todas as sensações que em nós dormem: esqueço-me de quem sou, do tempo que por mim passa, das ridículas obrigações dos dias esvaziados de sentido e de infância e leio detidamente, como quem reza, esse bocado de mim que alguém escreveu mesmo antes do projecto da minha existência.
Ao meu lado, uma voz traz-me ao mundo, pergunta:
«- E o que vai tomar para acompanhar esse livro?...»
«- Um mil folhas e… um chá. Um chá de livros.»
Autor: V. P.